segunda-feira, 18 de março de 2013

Dia Nacional da Poesia





Desculpa se parei de escrever vocês.
Acho que pensei menos e senti mais nos últimos anos.
Senti tanto que não consegui mais conversar com o papel.
Nunca o larguei, no entanto. 
Marquei com lágrima, beijei com carinho, amassei de raiva.
Mas nada de caligrafia caprichada nas folhas pautadas.
Escrevi muitos bilhetes rápidos que continham mais sentimento do que jamais consegui com vocês.
Escrevi, com uma dedicação obcecada que nunca foi-lhes dedicada, sobre assuntos de ordem prática, burocráticos até.
Nunca fui uma boa aluna.
Decepcionei, até quando tentava, todas as rimas.
Sinto que abrir velhos cadernos é violar alguém que não sou eu.
Vocês agora ficam guardada em rascunhos lépidos de e-mail.
Nem mais um verso metrificado, nem mais uma tentativa de elaborar.
Mas você também errou.
Me fez achar que o mundo era uma coisa, e não era.
As vezes senti que tudo que aprendi com você foi mentira. 
Que o mundo é muito mais cru e que rimar é uma coisa besta.
Que sentimentos são mais verdadeiros no papel.
Mas sossegue!
Um dia a gente se esbarra.
E não vai ser com essa linguagem vulgar, esse barulho de teclado irritante e esse cursor que vai e volta.
Vou pegar o lápis e o papel amarelado.
E você nunca vai lembrar que estivemos separadas.
Porque, na verdade, você sempre esteve na minha mente. 
No meu corpo, na minha esperança, na minha entrega.
Eu sou você. 

Esquina





A esquina iria separar os dois. Juntos, de mãos dadas, caminhavam na mesma direção e também na mesma cadência. Ele chegava a andar torto, trôpego, tamanha era a fascinação pelo rosto dela. Seus olhos castanhos e grandes, seu cabelo curto, suas sardas claras. Poético. Ele seguia para frente, em frente, mas olhando para ela. E sorria.
Ela encarava o chão. Distraída, talvez. Mas sua mão apertava a dele e seus olhos se encontravam com ternura. Passaram pela banca de jornal, pelo sinal e chegaram a esquina. Dura, fria. Mas ele não a enxergava, só olhando para o lado. Quando ela parou suavemente, ele deu um tranco. Sobressaltou-se e reparou seu movimento, ou a parada dos movimentos. Seu sorriso quase desapareceu, mas restou um ínfimo. Ele ainda estava feliz por ter tido ela por tanto tempo, por toda a noite.
Ela estava desolada, não sabia como seria todo aquele tempo sem ele, que por sua vez, mantinha-se calmo para ela. Seus corpos se encontraram calmamente, ela passou a mão por seus cabelos negros e ele a envolveu com seus braços. Os rostos se aproximaram, e ela se sentiu o cheio e menta do seu hálito, sorrindo abertamente antes de beijá-lo. O beijo durou alguns segundos, ninguém parou para observar, o mundo não girou, só o sol da manhã era espectador. E era assim que eles queriam
-Tchau, amo você. - disse a jovem baixinho com um pesar absoluto na voz. Ele fechou os olhos ao ouvir as palavras, concordando com a cabeça e esfregando o rosto em seu pescoço, como se para sentir seu cheiro e o cabelo ainda molhado. Beijou a mão dela e ficou parado, observando ela partir. Sua luz desapareceu, mas ele aceitou.
Por um instante, achou que ela fosse parar no meio do caminho. A viu dando a volta, correndo e o abraçando, talvez quase o derrubando. Mas ela seguiu decidida, sem olhar para trás. Deu uma corridinha e entrou no metrô para ir trabalhar.